domingo, 27 de setembro de 2015

Abram os vossos corações.



O equinócio de outono fazia-se sentir naquela manhã solarenga mas algo fria de final de verão. A luz intensa irradiava-me a alma, irrequieta e ansiosa pelo fim de semana de reencontro com um Eu repleto de sonhos e motivação. Passara os últimos meses a adiar objectivos e recomeços, num constante tumulto interno de incertezas e medos, que me assolavam o Ser.

Levei comigo toda a energia de um dia abençoado, o meu tapete pronto a se moldar aos meus pés e às minhas mãos algo desajeitados ainda, insuflei vigorosamente todos os meus alvéolos com a neblina tímida que se evaporava levemente da epiderme delicada da natureza vespertina e segui o meu caminho, finalmente. Finalmente.









Um felino ferido deu-me as boas vindas na quinta, esfregando o seu corpo frágil no meu, também ele frágil. Fragilizado por meses de descuido e distanciamento da prática, sinto-o a querer despertar forte da inércia e da desconexão que o tempo teimava em encorajar e enraizar.



Consigo hoje, passados já alguns dias, esboçar detalhadamente, os meus passos desapressados, naquela manhã calma e encantadora com essência a outono.

Uma ou outra folha bailava entre inspirações e expirações da mãe terra, deslizando vagarosamente pelo solo humedecido. Os animais entoavam mantras de sobrevivência, eu tocava-lhes a pele, numa busca gentil de conexão e gratidão.




Os raios de luz cintilantes acariciavam as águas prateadas, que ondulavam entre rodopios de cisnes deslumbrantes. Fiquei-me a aspirar todo este aroma mágico de Vida e de amor, moldura pitoresca que se abria pela janela do shala improvisado par estes dois dias.




A Filipa esperava-nos de coração aberto e de sorriso afável e apaziguante. Os seus olhos brilhavam entre beijos ternos, o Minho enfeitiça a quem o contempla.



Há muito que esperava conhecê-la, pela sua bonita história de vida, pela sua alma tão especial, pela sua dedicação plena ao yoga ashtanga vinyasa , por todos os bonitos textos, tão simples e tão puros, que partilhou e que eu li e reli vezes sem conta. Conhecê-la no lugar onde tenho as minhas raízes foi como que me enraizar à Vida, ao Yoga, ao Ashtanga, da forma mais bela e mais comovente possível, foi como que o toque de determinação que me faltava para recomeçar esta caminhada, de coração aberto.

Agradeço todos os dias por ter tomado esta feliz decisão, por ter seguido o meu coração, como me disse um dia em conversa a minha amiga Ana. Permitiu-me conhecer pessoas com um grande coração e que, por alguma razão, precisavam de se conhecer para seguirem os seus percursos de vida. Todas elas são especiais e se complementam, todas elas procuram o mesmo caminho mesmo que por motivos distintos e necessitavam de esta cumplicidade, partilha e ligação para prosseguirem. Todas elas têm um lugar especial no meu coração. Espero que não demoremos a nos reencontrar, fisicamente, porque o que nos une é bem maior.




Iniciámos a prática calmamente, sem pressas, com o sol a aquecer o chão do shala. Dedicada, a Filipa conduziu os nossos corpos numa conexão divina de devoção. Quem inicia esta caminhada fá-lo despido de preconceitos ou estereótipos, purificando-se de uma sociedade sem valores e sem genuinidade. Fá-lo por si e pelo outro, fá-lo em liberdade e em desapego, fá-lo sem procurar reconhecimento ou grandiosidade. Grande é o que está para lá da prática, o samadhi.

Há quem solte lágrimas durante alguns asanas, pela emoção que emanam, há quem sorria, há quem sinta o suor a deslizar pela face e as gotículas a aglomerarem-se em pequenos charcos em frente ao tapete, há quem irradie serenidade durante o samasthiti, há quem se deixe levitar durante o shavasana, há quem sussure mantras e há quem os os entoe com devoção, há quem se deixe embalar pelo som do mar durante o ujjayi pranayama. As emoções são diferentes para cada Ser, somos todos tão únicos mas é esta certeza que torna a prática tão genuína. E que todos abriram os seus corações.

Partilhámos alegres conversas, chás e deliciosas refeições. Ouvimos deleitados os conhecimentos da Filipa sobre Ayurveda e alimentação yogi, doshas, sonhos e medos, como manter a regularidade da prática, os obstáculos à mesma e quando praticar, a tão importante hora néctar, os seus "daily essentials", o sadhana e os oito passos do Ashtanga segundo Patanjali, meditamos e ecoámos mantras. Mantras esses que ainda ecoam na minha mente.



"Eu entrego, eu confio, eu aceito e eu agradeço". Professoe Hermógenes




"OM

BHUR BHUVAH SVAH
TAT SAVITUR VARENYAM
BHARGO DEVASYA DHEEMAHDHIYO YO NAHA PRACHODAYAT" Gayatri Mantra




"May you be well.
May you be happy.
May you be free from suffering.
And all the causes of suffering.
May you know happiness.
May you be well.
May you be happy."




"Abram os vossos corações" Filipa

Obrigada, Filipa e a todos que fizeram e fazem parte desta bonita jornada!

Namaste