sexta-feira, 16 de abril de 2021

As palavras têm luz.





É indelével a permanência das palavras nas páginas de papel, de um caderno esquecido ou acomodado nas memórias de uma mesinha de cabeceira. É talvez incerta a existência dessas mesmas letras aprumadas e ordenadas, num qualquer lugar virtual deste mundo, onde a mestria inusitada da escrita não é mais do que um carrossel em constante movimento e é talvez por si só, uma menosprezada fuga à massiva e à fluida locomotiva de imagens, publicidade e telegramas, mais facilmente absorvida e esquecida, o "fast food" textual e visual dos nossos dias corridos e corrompidos.

Fluiram os dias e os meses, as emoções, assim como as estações, acomodaram-se às variações dos tempos e dos alentos. O que a mente esboça,  o corpo rasura. Rodopiam intransigentes as palavras soltas, à procura do seu par de dança perfeito. Talvez o encontrem entre sinapses eufóricas, talvez a pulsação se acalme e as frases se aglomerem pomposas e eruditas. 

Esfumaram-se os anos, e com eles, a solenidade da escrita criativa, enebriada pelos goles de polpa linguística, adoçada pelo néctar carnudo das obras primas literárias. 

Adormece a ânsia de exprimir e expremer as vivências, as sonoridades dos pensamentos e o silêncio da inquietude. Guardam-se folhas soltas, num lugar acomodado para o efeito, à espera de um dia lhes voltar a tingir a alma. 

A escrita apenas discorre quando é o âmago da vida que nos guia. Amadurecemos a subtileza dos gestos, purificamos a consciência e a atenção, organizamos a memória e as emoções. 

Livremente, espontaneamente, naturalmente, a mão volta a traçar os textos mais sentidos.

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